19 de julho de 2009

TEATRO FÚRIA

Furiosos de Cuiabá partem para estremecer Curitiba

A partir de novembro, Teatro Fúria leva para Curitiba, toda sua fúria na mala e, enquanto não se muda, segue aberto com sua escola de Teatro

Por Viviane Petroli para o Jornal Circuito Mato Grosso. Fotos: Arquivo Teatro Fúria

Tudo começou ainda na Cuiabá do século XX, mais precisamente em 1992, quando ainda adolescentes Péricles, Caio, Giovanni, Bruna e Toledo eram alunos de Gilberto Nasser, no Grupo Ânima, que era um teatro amador feito nos finais de semana na antiga Escola Técnica Federal. Contudo em dezembro de 1998 ,é que realmente nasceu o Teatro Fúria. Nasceu como um grupo de teatro profissional. De acordo com Péricles, o Grupo Anima, no início do caminho do Fúria, foi que lá, não só se desenvolveu o trabalho de ator e sim um trabalho de dramaturgia, de direção, iluminação e sonoplastia e, que todo esse aprendizado, lhes deu segurança para começar a desenvolver a linguagem do Fúria. “É por isso que sempre citaremos o Ânima e o Gilberto Nasser, que nos iniciou de forma generosa e sem cobrar nada”, comenta Péricles.

Até o ano passado, o Teatro Fúria funcionava de forma fechada e, este ano, resolveu inovar e abriu a Escola do Teatro Fúria, onde todos que participam da Escola avançam com os criadores, em sua pesquisa, é considerado um furioso. Hoje, desde a criação do Teatro Fúria, apenas Péricles, Caio, Giovanni e Bruna continuam na luta para mostrar o que é o Fúria. Conforme Péricles, Toledo deixou o Fúria no final de 2008, mas quando quiser voltar sempre encontrará as portas abertas e os companheiros de luta de braços abertos. “Com a saída de Toledo, no ano passado, mas que tem o direito conquistado de voltar à hora que desejar, portanto, ele também, mesmo que desminta isso, é um de nós, hoje temos no Fúria a Emily como a mais nova integrante da Aldeia. A Emily é sobrinha do Amir Haddad, uma das grandes almas nobres do teatro nacional e, para nós, é uma grande alegria iniciá-la no teatro”, conta Péricles.

Péricles conta que o nome Teatro Fúria é devido ao fato de eles serem “os furiosos que reagem às expectativas impostas pelo sistema democrático/capitalista/cristão”. Para eles Fúria significa coragem e luta. “É o nome que representa nosso estilo de fazer teatro: o teatro não como profissão e sim como estilo de vida”, completa Péricles.

Apresentações
A primeira apresentação do Fúria foi o espetáculo Nepal que aos poucos foi dando espaço para outras peças. Na sequência de Nepal vieram Consolero, Frederica, Encaixotando Shakespeare, Frederica – a Verdade Maior que o Corpo, Apartamento 501, Rochdale, A Justiça do Zero a Zero, Os Bichos Narram Quixote. Segundo Péricles há dois novos textos que ainda não foram estreados, que são O Buraco e Carrossel Cusco. “Carrossel Cusco estreia este ano e foi premiado pelo Cuiabá Cidade Arte, da Secretaria Municipal de Cultura de Cuiabá. Tínhamos um projeto no centro de detenção de menores, o Complexo Polmeri (antiga Fazendinha). Lá fizemos dois espetáculos que foram o Quebra-Cabeça e Por Trás do Pano”, lembra.

Por ser um grupo de vasto repertório, o Fúria está com vários espetáculos em cartaz. Entre os mais requisitados estão Nepal, Frederica e Encaixotando Shakespeare, mas não na Hell City, como Cuiabá vem sendo chamada no universo cultural e sim pelo país e festivais nacionais e internacionais de teatro. “Apresentamos mais fora de Mato Grosso do que por aqui mesmo. Por ser uma cidade pequena, as temporadas são rápidas. Geralmente sete dias quando o espetáculo é dentro de teatro e um mês quando é em espaços alternativos. Por intermédio dos festivais e programas de circulação de espetáculos (Palco Giratório – Sesc Nacional, Caravana Funarte, projetos particulares contemplados pela Lei Rouanet) já percorremos com nossos espetáculos e laboratórios, 18 Estados e perto de 60 cidades brasileiras. Nesta segunda década, queremos percorrer a América Latina”, revela Péricles.

Diferenças
Péricles diz que cada grupo teatral é diferente um do outro, mas que a grande diferença do Fúria para os outros é que eles são um grupo de motivação ideológica política e social. “Os espetáculos dizem o que os integrantes têm a dizer. Nos interessa o sucesso, mas não o sucesso oriundo das expectativas do sistema. Queremos o sucesso oriundo de conseguir dizer as nossas verdades amadurecidas e desenvolvidas nos ensaios. O sucesso para nós é conseguirmos desenvolver um modo para dizê-las, que cause interesse no público sobre as verdades que acreditamos. Isso, às vezes, pode parecer a quem não nos conhece, que vivemos a dar murros em pontas de faca, mas não é assim. O fato é que sabemos exatamente o motivo de fazermos teatro e o nosso teatro está diretamente ligado ao nosso espírito. À motivação que nos leva a viver”, explica Péricles.

Rumo à Curitiba
Dentro de menos de quatro meses o Teatro Fúria estará de malas prontas rumo à Curitiba (PR), não para uma apresentação e sim de malas prontas para se fixar na cidade. Péricles conta que o grupo já está estagnado e que, nesta nova década, a principal vertente do Fúria é a Escola do Teatro Fúria, “pois é a Escola que fará o aprimoramento da nossa linguagem e a renovação do Teatro Fúria e os Insurretos Furiosos Desgovernados”. Péricles completa dizendo que “aqui ninguém dá a mínima para ela. Temos atraído ótimas cabeças, mas em quantia insuficiente de experimentadores. Para mantê-la viva utilizamos o mesmo método que usamos para manter vivos nossos espetáculos: A perambulação por outros Estados brasileiros”.

Hoje a Escola de Teatro Fúria funciona na Galeria do Insurreto Pádua Nobre e, por ainda ser nova, possui poucos laboratórios. Até o momento são quatro laboratórios, divididos cada um em carga horária de 25 horas.

Confira os quatro laboratórios da Escola Teatro Fúria, segundo Pérícles:
1) Laboratórios para sujeitos curiosos leigos - IniciaçãoSempre de forma muito lúdica e prazerosa, os experimentadores tomam contato com a mímica, a construção de personagens da comédia dell'arte, encenação de esquetes, o teatro do oprimido de Augusto Boal e a construção de cenas de modo autogestivo na Caixa-Mágica com suas Marionetes Humanas.Carga horária de 25 horas

2) Laboratórios Democráticos - para artistas iniciadosExperimentamos o que desde pequenos nos ensinam sobre o que é democracia e como ela funciona. Como a democracia é na realidade e como na realidade funciona, o que devemos fazer para a democracia ser mais eficiente, no que diz respeito à promoção de justiça e O QUE deveria ser a democracia e COMO deveria ser. Após estes laboratórios, o artista iniciado terá muito mais clareza da função ou disfunção do artista nas circunstâncias democráticas.Carga horária de 25 horas.

3) Laboratórios da Dramaturgia da Árvore - Oficina de dramaturgia. Se experimenta passo-a-passo os métodos de construção de textos teatrais do Teatro Fúria neste últimos 10 anos, se analisa outras dramaturgias, maneiras de se explorar o sub-texto e superobjetivo, experimenta-se a adaptação de outras obras para a linguagem de cena e se mostra as convenções de comunicação.Carga horária de 25 horas.

4) Desalienação dos sentidos - O laboratório Desalienação dos sentidos visa despertar, através de exercícios de consciência dos cinco sentidos (tato, audição, paladar, olfato e visão), o 6º sentido: A desalienação social e política. A interpretação dos verdadeiros interesses por trás das mensagens nos impostas pelos governos, mídias e religiões moralizantes. E como conseqüência, a análise de nossos irracionais comportamentos tirânicos, desenvolvidos pela nossa educação autoritária, em prol dos interesses do sistema capitalista/democrático/judaico-cristão. Carga horária de 25 horas.

Fúria e o cinema
O Fúria, conforme Péricles, sempre teve o objetivo de criar um núcleo de cinema, intitulado O Cinema Fúria, quando se mudassem e estivessem estabelecidos com a Escola e a sua Aldeia em Curitiba. Péricles conta que tem um cunhado que é cinemeiro em Atlanta e que ele faz filmes e dá aulas de cinema na faculdade dos Estados Unidos e que ele tinha muita vontade de fazer um filme em Chapada dos Guimarães. “Calhou de ele dar uma palestra no Rio de Janeiro sobre cinema, então adiantou sua viagem em dois meses para que, enquanto ele viesse nos visitar, antes de seu compromisso, fizesse um curta-metragem conosco. Mas como eram poucas locações, poucos atores e, além de tudo, tivemos muita colaboração voluntária, observamos que o custo de produção deste curta não seria tão superior ao custo de um longa e, por isso, optamos pelo longa, já que é muito melhor pra sua divulgação, já que ninguém dá a mínima pra curta metragem. Em suma: a história do filme é esse. O nome do filme é Transmigration of Soul and Body e é uma parceria do Cinema Fúria, Universidade de Artes de Atlanta, Universidade de Artes de Pitsburg, Social Filmes de São Paulo e Sunshine Entertainment de Nova York e estreia em outubro nos Estados Unidos e no Brasil. Foi filmado em Chapada dos Guimarães e algumas poucas imagens aqui em Cuiabá. É uma história sobre delírio”, explica Péricles.

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